segunda-feira, 13 de maio de 2013

A CRIANÇA, SUA HISTÓRIA, OS PROFESSORES E A REPETIÇÃO


Nas salas de aulas, é frequente que professores e alunos encontrem crianças que pareçam ser impossíveis. Estes alunos acabam sendo marcados como difíceis. Muitas vezes, sua permanência na escola fica comprometida. Pais, crianças e professores saem "arrasados" desta experiência, prometendo nunca mais repetir o feito, mas todas as mudanças propostas não surtem efeito.
O que pode estar acontecendo?
É claro que o problema tem múltiplos fatores, mas há um aspecto que considero da maior importância, cuja explicitação resulta em eficácia, e pouco vem sendo abordado nas escolas, frente a este problema.
Trata-se do fato dos adultos que se ocupam da criança estarem induzidos a viver papéis dos quais jamais se imaginaram desempenhando. Isto é, realizam junto com a criança um tipo muito particular de rememoração, desempenhando e agindo de forma estranha para eles mesmos. Com freqüência, o educador terá a sensação de não se reconhecer ao tomar uma atitude, mas, inevitavelmente, diante desta criança, protagoniza este papel.
O que é isto?
Todos nós temos uma verdade que não é lembrada facilmente, trata-se de um esquecimento sobre um fato importante e determinante da história de cada um. Em geral, serão fatos desta natureza que rememoramos, não através de uma recordação, mas através de uma atuação, reproduzindo, sem nos darmos conta disto, temas que são motivo de conflito psíquico para nós.
O que se observa é que com esta criança considerada difícil, os profissionais acabam exercendo papéis que repetem cenas importantes da história desta criança que foram completamente esquecidas. Em geral, tais fatos da história dela estão de alguma forma relacionados com a sua dificuldade de integração. Isto pode acontecer sem que nenhum dos envolvidos possa se dar conta disto ou saiba explicitamente destes acontecimentos.
Uma vez que os profissionais caem nesta rede repetitiva da criança, ambos passam a viver fatos, entendidos como problemas pessoais, sem saber. Neste momento, a criança é deixada de escanteio e surgem vários conflitos entre os membros da equipe que trabalham com ela.
Quando é possível expressar estas vivências, nas reuniões de professores ou na supervisão institucional, veremos que independente da pessoa envolvida, o papel é desempenhado da mesma forma.
Por exemplo, João é uma criança inteligente e ativa, mas não consegue permanecer em nenhuma escola. Embora não tenha nenhuma dificuldade de aprendizagem, é muito agressivo e destrutivo com os colegas. Tem uma grande habilidade em desqualificar as outras crianças, principalmente, diante do olhar de uma autoridade, em geral a professora, deixando a outra criança muito constrangida, por vezes incapaz de prosseguir na sua produção.
Esta cena se repete quando a coordenação pedagógica da escola entra em sala com o objetivo de mediar o problema. João consegue realizar toda sorte de atitudes, colocando a professora em uma situação em que se sente muito desqualificada, portanto, constrangida diante de seus superiores. A professora chega a se questionar se é capaz de ser uma boa profissional.
Se buscarmos na história de vida de João, veremos que há alguma situação que aponta para esta vivência repetida por aqueles que lhe prestam atenção e cuidados. Situações como o fato da avó paterna nunca ter autorizado a mãe de João a ser integrante da família; ou a mãe, por ocupar uma posição de grande prestígio social, desqualifica o marido por não ser tão bem sucedido como ela -  uma insistência repetitiva na qual todos acabam se envolvendo como protagonistas.
No momento em que estas vivências são explicitadas e reconhecidas como determinantes nestes mecanismos repetitivos que impedem a inclusão da criança na escola, o peso e mal estar da equipe que se vê capturada por estes mecanismos são aliviados, produzindo uma mudança no cenário de trabalho. Todos podem reconhecer o que está ocorrendo, integrando e elaborando as vivências, o que certamente produzirá grande diferença para a criança.